domingo, 6 de julho de 2014

O 5° aniversário do Camaleão.

(google)

O Camaleão Sentimentalista completou cinco anos de existência no ultimo dia 20, e para comemorar ele decidiu convidar novamente os amigos, os colegas e as pessoas de bom coração e mentes abertas ao saber. Ao longo do mês de julho o blog receberá ilustres convidados acompanhados de seus textos, contos, cartas e tudo o mais que se expresse através de palavras. Sendo eu o dito camaleão e proprietário deste blog, confesso minha felicidade e contentamento em ter chegado até aqui; de todos os projetos que me dediquei, das coisas que já fiz e assinei, o Camaleão Sentimentalista é sem dúvida dentre todas elas o meu maior orgulho e prazer.

Sejam todos muito bem vindos; leitores, amigos e blogueiros. 
Pedro Bravo Jr. foi o escolhido para abrir às comemorações, ele já é de casa, o camaleão o recebeu em outras ocasiões e por isso dispensa apresentações.
Apreciem.


Três mundos distintos e um elo de ligação: a alienação

 As histórias a seguir se passam na época onde o contato pessoal era mais importante e valorizado do que hoje, pois a tecnologia que veio para nos facilitar o acesso a tudo é a mesma que nos segrega e, principalmente, nos aliena.  Tudo se passa em São Paulo em meados dos anos 90. Eram sete horas da manhã, quando o despertador toca para acordar de forma, agressiva, opressora e controladora Wellington, de 26 anos, que cursou o ensino médio de forma regular na escola estadual de sua comunidade no bairro do Grajaú. Ajudante geral de uma firma no bairro da Vila Matilde, Wellington tem que levantar nesse horário e, rapidamente, tomar banho, arrumar sua mala com o uniforme e sem tomar café (pois só vai tomar no refeitório da firma com os colegas de trabalho). Pega o ônibus às 7h35 para chegar na empresa às 08:40, bater cartão às 09:00 e deixar o posto de trabalho somente às 18:20 Até chegar em casa já são 20h. Isso se repete de segunda a sábado. Wellington, em suas poucas horas de conforto e lazer, se diverte ouvindo o que mais se consome nas comunidades carentes, o pagode, mas também tem outras paixões. Adora assistir futebol pela televisão (afinal ganha pouco e não tem tempo para ir no estádio. É torcedor fanático do Santos, time que aprendeu a gostar com seu pai Glauber falecido a dois anos de infarto), paquerar as garotas do bairro ecomo resquício de sua infância, ele empina pipas em um descampado próximo da sua humilde casa.  Wellingtonnão discuti política não se interessa por ler jornal, livros, não gosta de cinema e nem de teatro, não pensa em nada a longo prazo (ele segue aquela frase da música do Zeca Pagodinho. “Deixa a vida me levar”), faz o que dá vontade (quando há tempo para isso), não reclama do pouco que tem e agradece a Deus tudo que possui. E assim passa-se os dias, tudo sempre igual. Rafael e Diogo são amigos que se conheceram quando eram adolescentes em uma loja de departamento comercial e logo ficaram grandes amigos pois tinham um ponto incomum, o grande nível intelectual. Adoravam tudo que não estava ligado ao senso comum, gostavam de artes, livros, cinema, política etc.  Estavam naquele lugar apenas para pagar metade da mensalidade de sua faculdade (afinal não se tinha a oportunidade dessas bolsas federais que os governos assistencialistas oferecem atualmente), pois a outra metade os pais bancavam.  O tempo passou e os meninos cresceram e conseguiram trabalhar no que justamente se formaram, o que não é fácil. Apesar de profissões distintas, não deixaram de ser amigos.  Diogo trabalha para uma revista burguesa, que defende ideias neoliberais (como por exemplo a implantação do Estado mínimo), e está sempre defendendo as ideias das elites. Não concorda com as propostas da empresa pois percebe que não faz parte daquela classe, no entanto, Diogo sempre foi ambicioso, gostava e gosta do que é bom e caro, para poder ostentar para os outros seus status, o que é absolutamente normal, afinal o capitalismo é um sistema onde as pessoas compram o que não precisam, com um dinheiro que não tem para mostrar-se para os demais uma pessoa que não é. Diogo mora na região da Vila Sabrina e trabalha no bairro belo mas, triste da Aclimação, e não tem hora certa para entrar no trabalho. A sua rotina semanal é de segunda a sábado (quando as vezes tem que trabalhar de domingo), entretanto, não tem hora para sair, está sempre ocupado e mesmo em seu momento de lazer e descontração está falando do cotidiano profissional. Vive e respira trabalho, até os seus hobbies preferidos já não executa mais, a vida dele é viver e doar sua intelectualidade, sua saúde e até mesmo sua alma para o jornalismo daquela revista.  E assim passa-se os dias, tudo sempre igual. 
Já Rafael é utópico, idealista e guerreiro de conceitos esquerdistas Atua como professor de Geografia na rede estadual. Mora na Vila Maria, no mesmo bairro onde trabalha. Acorda diariamente às 06h20 para chegar às 07h e sair às 12:20, depois disso ele sai apressado  se encaminhando para trabalhar em outra escola onde tem mais seis aulas, ou seja, sai do trabalho às 18h e chega em casa por volta das 19h15 de segunda a sexta “na teoria”, pois quase sempre está ocupado com correção de atividades escolares, planejamento de aula, reuniões do sindicato e etc.  Rafael é muito atento a tudo que se passa na sociedade e adora discutir criticamente com todos, até com seu amigo Diogo, seja por telefone ou pessoalmente. Rafael tem esposa e um filho pequeno, mas, infelizmente, é muito concentrado no profissional e pouco no pessoal.  E assim passa-se os dias, tudo sempre igual. Sendo assim, o que eles tem incomum?!  Os três personagens em questão mesmo vivendo rotinas  em camadas sociais distintas, todos sofrem do mal da alienação, que consomem suas vidas e por causa desse mal eles não tem a oportunidade de saber o que é viver, eles apenas sobrevivem em sua sociedade cosmopolita que tem como essência a maldita pressa. ALIENAÇÃO é a doença psicológica que prende as mentes em um cotidiano estressante, que adoece o corpo e impede que as pessoas de sentir o que a vida pode oferecer, ou seja, um equilíbrio em aproveitar tudo em benefício para o cérebro e para o físico, e engana-se que a alienação é algo que atinge só as pessoas do senso comum, atinge sim a todos aqueles que focam um só elemento, temos alienados políticos, culturais, esportistas, sociais e etc. A história mostra que Wellington trabalha direto e só dedica o seu tempo para o lazer e esquece de absorver toda e qualquer produção humana a respeito de algo mais crítico e reflexivo. Já o personagem Diogo vive em função da manipulação de massas que a mídia impõe e o mesmo vive em um intenso comum para poder tentar entrar no mundo das elites mesmo não pertencendo aquela classe. Rafael que trabalha com a educação e formar opiniões, construir mentes criativas e críticas vive em um antagonismo, pois ele se dedica tanto em auxiliar outras pessoas em melhorar uma sociedade que se esquece de viver para si, ou seja, os dois não aproveitam a parte do lazer.  A alienação é nada mais nada menos do que o fator que faz com que as pessoas não enxergue nada ao seu redor ou até mesmo na sua frente, somente aquilo que nós achamos o que é importante, a verdade absoluta, o elemento fundamental para nossas vidas, e só depois, muito depois, é que a vida irá mostrar o que não  aproveitaram, gozaram, deliciaram o melhor que a vida tentou o todo tempo proporcionarOs indivíduos alienados só viveram o que colocaram como foco e quando perceberam o tempo já tinha passado. Eles envelheceram e não iram aproveitar mais o bom da vida, pois perdeu a essência da mesma, a força da juventude, essa mesma força que desperdiçaram com coisas secundárias, e o que irá acontecer com os mesmos agora, sem saúde e condenado a viver com a velhice e a solidão? A resposta é simples, viveram s lamentando e perguntando a si mesmos porque não aproveitaram mais a vida naquele exato momento que passou e que nunca mais voltará, estarão arrependidos e reclamando da vida em seus respectivos cantos dia após dia. E assim passa-se os dias, tudo sempre igual.    






Pedro Bravo Frutos Junior, Professor de História da rede Estadual de São Paulo. 

Um comentário:

  1. Sinceramente, esse foi um dos melhores textos sobre alienação que eu já li. Eu já estudei muito sobre o assunto, tanto no ensino médio como agora na universidade, sem contar as inúmeras conversar e discussões sobre o tema. O ponto é que a alienação sempre aparece como algo que existe, que todo mundo sabe que existe e que todo mundo consegue exemplificar (ainda mais quando unida a ideia de cultura de massa), mas que dificilmente a gente vê claramente em toda a sua extensão. Ela é geralmente colocada com limitação às pessoas que assistem novelas e não sabem sobre política e afins, sendo que na verdade vai muito além disso tudo. Eu via essa alienação de modo mais geral, mas nunca consegui ver "exemplos práticos" dela como os colocados aqui. Esse texto clareou muito a ideia que eu tinha e, com certeza, trouxe uma forma de visão fantástica da alienação.
    Não me surpreende que tenha aparecido aqui no Cameleão! Esse blog é muito digno de um texto como esse!
    Abraços

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